DEPOIS DE MORTO


Esta noite foi uma coisa, o espírito do mortinho ainda continua atacando.
Ele desencarnou recentemente e sua atitude ainda é se manter no confronto ideológico de nos retirar desta cidade. Em vida foi uma pedra no sapato e agora é um caminhão de inverdades.
Como sabem eu não posso dar nome aos bois, mas posso descrever os fatos.
Foi uma investida deste espírito que não aceita sua morte. Ele ainda pensa que está no comando e quer assegurar sua dinastia. Não aceita que tomem o que era dele.
Lutar contra o amanhecer é mexer com forças desconhecidas ligadas diretamente a Deus. São poderes sobrenaturais que a terra desconhece.
Ele chegou aqui lá pelas três da madrugada querendo impor sua vontade e sua autoridade.
_ Vocês ainda estão aqui!
_ Salve Deus!
Fui dando espaço para o mortinho falar. Deixei-o bem a vontade, somente assim eu saberia quais as suas intenções.
Ele falou e falou, toda hora era uma ameaça. Vi no seu dedo um anel preto com uma caveira prateada. Não posso descrever o que seja, pode ser uma ligação com outras coisas desconhecidas.
Com semblante doído sua memória está sumindo. A única coisa que o mantém acordado é o ritual que invoca mundos esquecidos, negros como o espaço.
Com uma capa preta em suas costas que arrastava ao chão e um capuz pendurado derramado sobre ela o seu rosto envelhecido esculpia a sua imagem, reconheci de imediato.
Não chegamos as vias de fato, mas defendi o que era nosso, o nosso amanhecer. Eu não baixei minha consciência para deixar este espirito entrar. Brigamos, sim, doutrinariamente para mostrar o caminho do bem. Ele por fim desistiu, por enquanto, de mexer com esta casa de Seta Branca.
Foram ascender velas na cruz do cemitério para que ele tomasse providências. Estão amarrando este espírito para praticar o mal.
O problema é que ninguém entende este mundo invisível que nos rodeia. Ele causa muita ansiedade e obscuridade nas almas enfraquecidas. Tudo se torna motivo de desencontros e narrativas tendenciosas somente para destruir o convivio familiar. Nossa doutrina é familiar, toda corte de Seta Branca vem das origens mais remotas deste planeta. Toda sua família trabalha no amanhecer. A trinta e dois mil anos envergando o conhecimento desta ciência.
Conforme as palavras que ele dizia eu quebrava no argumento do evangelho. Usando do livro de Cipriano ele invocava as falanges negras. Eu segurei o livro capa branca, símbolo da cristandade, da vida de Jesus. Havia dois lados, o meu e o dele. Um mundo branco e um mundo negro. Os dois eram como água e azeite, não se misturavam. Como a divisão dos dois rios que um não entra no outro, se margeiam somente.
Foi assim que ficou registrado este encontro da luz com a escuridão.
Logo teremos respostas.
Não sejam cavalos dos mundos negros e sim aparas de Nossa Senhora da Conceição.
Salve Deus!
Adjunto Apurê
An-Selmo Rá
15.06.2021

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