PADRINHO DE ADJUNTO

Meu padrinho desencarnado voltou para ajudar.

Primeiro vou explanar o que seja compromisso com o vale do amanhecer. Todos que fazem parte deste caminho tem que ter responsabilidade com o sacerdócio de Seta Branca. Não tem como enganar o Pai indo para outra direção. Eu até diria que não fica bem chamar de meu pai não respondendo aqui na terra ao seu comando onde temos responsabilidade com os nossos juramentos. Ser jaguar é arregaçar as mangas e fazer com que a máquina ande. Tem jaguares que se escondem da verdade, não querem ter o menor trabalho em ajudar. Claro que tem os que se empenham muito para erguer esta missão.

Eu estava aqui quando o meu ex-padrinho chegou. Ele veio justamente para me avisar sobre a destruição da mata ao redor do vale. Fomos os dois para dentro da mata e lá a clareira estava aberta, destruição das margens do córrego e derrubada de árvores.

Eu me senti impotente diante daquilo tudo. O trator ia e vinha cortando a terra e empurrando os entulhos para que não fossem vistos. Ao João mostrar ele disse que iria me ajudar a acabar com esta destruição. Eu não disse nada, nem sim e nem não, porque eu estava desnorteado com esta imagem infeliz.

Eu só olhava o que um ser humano ganancioso por terras pode fazer. Ele é dono de um loteamento que faz divisa com o vale e quer por toda a finalidade se apossar de tudo. O povo Caiapó está dentro da mata e eles estão assustados com esta movimentação. São espíritos de cura, não de ódio, não de violência.

João voltou para trabalhar de alguma maneira aqui no vale. Não como entidade, mas como amigo que precisou muitos anos após seu desencarne para se conscientizar de sua identidade. Vejam, jaguares, ele em vida se afastou da missão por meros caprichos humanos. Foi ele quem pediu e registrou seu desencarne, como tudo seria. Muitos anos ele ficou perambulando aqui na esquina do templo me incomodando. Após anos ele desceu no aparelho e pediu perdão por tudo. Ali foi um resgate.

Eu não cobro de ninguém para que ajude o templo. Eu só digo que depois que desencarnar as consequências serão outras. Não tem como chorar, se revoltar e se lastimar por não ter feito nada. O pai ajuda quem ajuda, principalmente dando condições do templo receber seus filhos que ainda estão perdidos nestas paragens.

Vejam o caso deste meu padrinho. Agora mais consciente de sua atribuição quer ajudar de alguma forma a libertar esta missão. A tribo não é feita de somente um, mas de todos que carregam seus corações dando valor ao sacerdócio.

Se um não quer ajudar, outro virá e tomará seu lugar. Outro que sinta o pai dentro do seu peito. Não queremos fanáticos, mas queremos missionários que deem valor. A casa é física e precisa de ajustes em sua estrutura. Eu ergui tudo com amor e por amor aos filhos encarnados e desencarnados que precisam deste contato com o céu e com a terra.

João disse que vai ajudar para acabar com esta destruição. Eu, Salve Deus, olhava para o povo caiapó que assustados com o homem branco não podiam fazer nada. Eu não sei o que vai acontecer daqui para frente. O Pai está vendo e alguma coisa não está de acordo com o que ele vê.

Eu voltei e o João ficou lá nas matas.

Salve Deus!

Adjunto Apurê

An-Selmo Rá

09.03.2021

Seja bem-vindo ao vale dos deuses!