NOITES SEM LUAR

Como foi difícil esta noite. O maligno estava atuando de forma a atingir o meu físico e ao meu espirito.

Eu não conseguia fechar os olhos, aquilo tudo parecia me sufocar, algo batia no meu plexo e me deixava angustiado. As minhas dores aumentaram tanto que por três vezes tive que me levantar.

Pedi nas minhas preces aplicando a água do amanhecer para ver a verdade e neste momento me desliguei do físico. Cheguei pelo rastro da sintonia ao local de onde partia esta vibração. Era um campo todo queimado e no meio das cinzas um vulto sentado em cima de uma pedra. Um ser escuro, diferente, que comanda uma legião de espíritos na sua ordem.

Ele estava com uma de suas mãos encostada sob seu queixo, parecia meditar, parecia controlar com sua mente os demais que agiam na calada da noite.

_ Eu quero que você fale de mim! Eu estou procurando um transmissor, um aparelho que emita meus sinais na terra!

_ Salve Deus!

Gritei em meu pensamento.

_ Aqui não existe o seu Deus! Aqui eu sou o Deus!

_ Salve Deus!

Eu gritei agora da boca para fora. Foi um impacto que ele não esperava, pois todos reverenciavam sob pena de serem rigidamente castigados.

_ Minhas dores, há, meu Deus, me conforte e me de forças para entender e ser entendido! Estou aqui em um mundo totalmente esquecido pela terra que há de um dia conhecer seus ais!

_ Não pense! Eu consigo saber teus pensamentos! Não sou igual a qualquer um destes escravos!

Assim eu parei de emitir meus pensamentos e passei a ouvir suas palavras diretamente em minha cabeça. Eu sabia que não estava sozinho ali, pois nestas longas viagens sem destino os cavaleiros nos protegem, mas este ser era superior à minha condição existencial.

_ Que lugar é este, pensei!

Agora ele não respondeu. Se ele falasse estaria comprometendo sua localização. Este mundo perdido nas cinzas de um vulcão. Não sei, pois não havia indicação de nada, tudo estava queimado, derretido.

Uma coisa eu sei, passei muito mal esta noite. Fui violentamente colocado contra a parede. Eu não tinha como sair dali sem ser visto. Minhas atitudes eram acompanhadas de perto. Ele queria um transmissor de seus pensamentos aqui na terra. Eu fiquei em xeque e não pensei em mais nada.

Sabem como é difícil uma pessoa da terra parar de pensar. O silencio espiritual é mais complicado ainda. Somos cobradores e somos cobrados pelos nossos pensamentos. Quando Jesus prescrever nossos restos cármicos nós deixaremos de usar nossos pensamentos, seremos livres para escolher um novo caminho, ou ficar na velha estrada mesmo.

O sol raiou e a luz me trouxe de volta. Foi muito triste o contato com este mundo. Meu plexo ainda dói. Estou sentindo os efeitos desta viagem e preciso manipular para desintegrar esta presença do meu caminho.

_ Que se faça luz! Que resplandeça sobre minha cabeça a verdade que os olhos veem neste lado espiritual! Somos viajantes, peregrinos, que através do conhecimento chegaremos até Deus!

Ainda vejo aquele vulto sentado em cima da pedra. Ele está lá, está acompanhando os desígnios da terra, está se fortalecendo no baixo padrão mental das mortes. Está havendo um arrastão de desencarnados para seu mundo. Pessoas que se diziam acreditar em Deus, mas que na hora da dor eles se revoltam contra seu criador.

Que Deus e Simiromba nosso Pai nos traga o alento necessário para as noites frias sem luar. Que Mãe Iara e Mãe Iemanjá intercedam pelas nossas vidas. Se não tivermos nosso cobertor para nos cobrir poderemos congelar pelo intenso frio que se segue nestas paragens do espirito deslocado.

Salve Deus!

Adjunto Apurê

An-Selmo Rá

15.02.2021

Seja bem-vindo ao vale dos deuses!